segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Uma maçã





As vezes parece, e geralmente quando estou sem fome, que eu sou igual a uma maçã. A maçã fica ali parada, inteira vermelha, madura, com toda aquela pose de esnobe, tentando intimidar, mas no fundo ela sabe que ela é apenas uma maçã. Ela até tenta ser toda classuda, mas se torna completamente sem graça quando se depara com o abacaxi. Ela também tenta chegar toda cheia de si, mas é profundamente insegura quando se encontra com a melancia. A maçã então, não faz nada a não ser se contentar em ser apenas uma simples e chata maçã.
Mas daí eu me lembro que o mesmo não acontece para a Dona Larva. A Dona Larva faz da maçã não só a sua fonte de alimento, como faz dela a sua casa, o seu lar e provavelmente o lugar dentro da qual ela vai passar toda sua vidinha. A maçã traz esperança para a vida da Dona Larva que, até então, não era nada a não ser uma simples e chata larva verde sem mãos e pés. A maçã é o bem mais precioso da Dona Larva e, então, a fruta mais importante de todas.
De repente, eu sinto fome de maçã. Quero devorá-la como se ela fosse a fruta mais saborosa que existe no mundo. Quero comê-la porque ela me inspira. E como com tanto prazer que, naquele momento, eu sinto que sou uma pessoa melhor.

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

La la lalala...



Eu encontrei a música mais linda do mundo! Mas eu nunca mais quero ouvi-la, para protegê-la. Eu já matei tantas músicas, mas essa não. Essa eu quero que viva e, por isso, nunca mais vou ouvi-la. Eu só lembro de partes dela. Algumas notas e algumas partes da letra que mais se confundem com "la la lalala". Mas o que eu lembro bem é da sensação que eu tive ao ouvi-la. Essa sim está inteira. Era como se a música tivesse sido feita pra mim, naquele instante, naquele horário - 11h36, com aquele Corsa e aquele Corolla na minha frente, com aqueles meus pensamentos, com aquele jeans, camiseta branca e tênis cinza, daquele jeito, naquela estação de radio. Por isso, ligar o radio a partir de agora pode ser arriscado. Mas se eu perceber que é ela que está tocando, eu mudo rapidinho, não tem problema. De repente eu até encontro outra música nessa outra estação. Mas a minha música está salva em mim agora. Nunca mais será ouvida e por isso, vai ser a música mais linda do mundo pra sempre.

quinta-feira, 1 de maio de 2008

1º de Maio




Hoje é dia 1 de maio, dia do trabalho. E pra falar a verdade, não me sinto especial de ser um mero trabalhador. O que eu senti, e eu não sei bem explicar o porquê, foi que o dia de hoje me fez lembrar da morte. Pois é, meio estranho, mas fez. Na verdade não foi especificamente da morte, mas uns minutos antes, no leito da morte. Aquele momento em que todo mundo se lamenta de tudo, do que fez, do que não fez, do que queriam fazer, como se não tivessem feito metade do que queriam. E de fato, nós nunca nos sentiremos completos. Nunca acharemos que uma vida é suficiente porque não sabemos o sentido dela. Ela não tem um objetivo. Ela não é uma resposta. Ela é vaga. Então tudo o que fazemos parece ser em vão. Dai temos a ilusão de que na morte iremos enfim chegar a algum lugar, mas não, nos enganamos. Viveremos sempre nessa angustia de correr atrás de algo que não vamos encontrar. Então não nos resta nada senão lamentar. O máximo que podemos tentar fazer nessa hora, na hora do leito, é tentar lamentar menos as coisas que não fizemos e que considerávamos importantes. E claro, cada um define o que foi mais importante na sua vida. Mas em geral, acredito que nessa hora todo mundo pensa: "Ah, eu deveria ter amado mais. Viajado mais. Sorrido mais." E ninguém vai pensar: "Ah, eu deveria ter trabalhado mais. Deveria ter dedicado mais tempo pra minha carreira." E é por isso que pra mim, a importância do dia de hoje é bastante questionável. Porque eu sei que se eu me dedicar pra me sentir especial hoje, no final não vai ser isso que vai fazer a minha vida ser menos lamentosa. Muito pelo contrário inclusive. E como eu busco sim ter a vida mais feliz e tranquila possível, o dia de hoje pra mim é tão comum quanto o dia de ontem.

quinta-feira, 13 de março de 2008

Uma simples conversa




Num papo bem informal com um amigo no celular, dirigindo o carro, voltando pra casa:
Ele: E ai, tudo bem?
Eu: Tudo.
Ele: Que que foi? Tudo bem mesmo?
Eu: Ah... tudo, né. Tô entediado como sempre.
Ele: Ai Mauro, você se leva muito a sério.
Eu: Como assim?
Ele: Você se acha muito extraordinário. Quando você perceber que você é uma pessoa comum, como todo mundo, você vai tirar um peso das costas. Dai você vai ser extraordinário.
Eu: ........
Ele: ........
Eu: ...... hum......

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

Que tédio...

O tédio me matou. Porque ele é como a metástase: é um câncer que toma conta de todo o resto. Ele chega de repente, do nada, sem sintomas, e quando percebemos já estamos contaminados e morremos.
E foi assim que aconteceu comigo. De repente eu me dei conta de que eu era entediado e tudo na minha vida era entediante. Esse computador, esse quarto, essas paredes, esses móveis, essa sala, essa casa, meu carro, as ruas, as pessoas, os lugares, São Paulo. O pior é que eu tinha tudo para não achar isso. Meus pais sempre me deram o que eu quis: os melhores brinquedos, as melhores escolas, as melhores viagens, muito amor e muito carinho. Então, eu tinha tudo pra achar a minha vida a mais legal de todas. Mas não. Minha vida era chata. Achatada. Banal. Ordinária. Era como se eu estivesse doente porque não sentia prazer em nada e em ninguém. Eu tinha tudo e não tinha mais o que fazer. Por isso, em busca de um remédio pra suposta doença, eu fugia pra inutilidade dos vícios comuns que me pareciam muito úteis: horas na internet, muita punhetagem, engordei uns quilos, dormia demais, conta telefônica alta, festas todo fds, sabia as falas de "Friends" de cor e todos esses tipos de drogas que me eram muito divertidas sim, mas que no fundo eu sabia que eram desculpas pra enganar a minha vida sem graça.
Então, pela ineficiência dessas drogas, eu resolvi procurar soluções mais eficazes. Arrisquei tentar encontrar um sentido na minha vida naquilo que eu sempre considerei serem as coisas mais valiosas pra mim, mas que no final até elas foram vítimas assassinadas pelo tédio: tocar piano não tinha mais o prazer da liberdade de criação, mas sim o compromisso de ser um desentediante; entrar no palco para atuar e cantar não tinha mais o prazer do aprendizado artístico, mas sim o compromisso de ser um desentediante; sair com amigos não tinha mais o prazer de ser uma troca de experiências e intimidades, mas sim o compromisso de ser um desentediante. Dai todas as minhas relações materiais e pessoais se tornaram fracas. Todas eram superficiais porque em nenhuma havia uma total entrega verdadeira de corpo e alma. Era como se eu fosse um zumbi - um morto que anda, fala, mas é gelado e insensível. E o tédio faz isso: mata. Assim como o câncer. Porque nós só estamos vivos quando produzimos, quando criamos. Quando estamos na inércia, sem fazer nada, entediados, estamos mortos.
Mas apesar do câncer ser uma doença incurável, a gente sempre tem esperança de que ainda vão encontrar sua cura. E eu também tenho muita esperança de que ainda vou encontrar a minha cura. Não acho que tentar lutar contra o tédio seja a solução porque acho que ele sempre vai estar aqui do meu lado me assombrando. Mas o que quero é encontrar o equilíbrio entre conviver com ele e ter força de vontade. Quero que ser entediado seja uma característica minha e não um defeito. Quero que, mesmo com todo o paradoxo, viver a minha vida entediante valha a pena. Dai pelo menos acho que vou me sentir um pouco mais vivo nesse mundo...